PROBLEMA DE EXPRESSÃO
Só pra dizer que te Amo,
Nem sempre encontro o melhor termo,
Nem sempre escolho o melhor modo.
Devia ser como no cinema,
A língua inglesa fica sempre bem
E nunca atraiçoa ninguém.
O teu mundo está tão perto do meu
E o que digo está tão longe,
Como o mar está do céu.
Só pra dizer que te Amo
Não sei porquê este embaraço
Que mais parece que só te estimo.
E até nos momentos em que digo que não quero
E o que sinto por ti são coisas confusas
E até parece que estou a mentir,
As palavras custam a sair,
Não digo o que estou a sentir,
Digo o contrário do que estou a sentir.
O teu mundo está tão perto do meu
E o que digo está tão longe,
Como o mar está do céu.
E é tão difícil dizer amor,
É bem melhor dizê-lo a cantar.
Por isso esta noite, fiz esta canção,
Para resolver o meu problema de expressão,
Pra ficar mais perto, bem mais de perto.
Ficar mais perto, bem mais de perto.
Carlos Tê
segunda-feira, julho 28, 2003
sexta-feira, julho 25, 2003
Tarde no mar
A tarde é de oiro rútilo: esbraseia.
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,
Pousa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue o seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia,
Desenha mãos sangrentas de assassino!
Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar...
E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas,
São as asas do sol, agonizantes...
Florbela Espanca
A tarde é de oiro rútilo: esbraseia.
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,
Pousa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue o seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia,
Desenha mãos sangrentas de assassino!
Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar...
E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas,
São as asas do sol, agonizantes...
Florbela Espanca
quinta-feira, julho 24, 2003
Regresso ao imaginário infantil...
No comboio descendente
Vinha tudo à gargalhada.
Uns por verem rir os outros
E outros sem ser por nada
No comboio descendente
De Queluz à Cruz Quebrada...
No comboio descendente
Vinham todos à janela
Uns calados para os outros
E outros a dar-lhes trela
No comboio descendente
De Cruz Quebrada a Palmela...
No comboio descendente
Mas que grande reinação!
Uns dormnindo, outros com sono,
E outros nem sim nem não
No comboio descendente
De Palmela a Portimão
Ferando Pessoa
No comboio descendente
Vinha tudo à gargalhada.
Uns por verem rir os outros
E outros sem ser por nada
No comboio descendente
De Queluz à Cruz Quebrada...
No comboio descendente
Vinham todos à janela
Uns calados para os outros
E outros a dar-lhes trela
No comboio descendente
De Cruz Quebrada a Palmela...
No comboio descendente
Mas que grande reinação!
Uns dormnindo, outros com sono,
E outros nem sim nem não
No comboio descendente
De Palmela a Portimão
Ferando Pessoa
quarta-feira, julho 23, 2003
"A Portuguesa"
Heróis do mar, nobre povo,
Nação valente, imortal,
Levantai hoje de novo
O esplendor de Portugal !
Entre as brumas da memória,
Ó Pátria, sente-se a voz
Dos teus egrégios avós
Que há-de guiar-te à vitória !
Às armas, às armas !
Sobre a terra sobre o mar.
Às armas, às armas !
Pela Pátria lutar !
Contra os canhões marchar, marchar !
Saudai o sol que desponta
Sobre um ridente porvir;
Seja o eco de uma afronta
O sinal do ressurgir.
Raios dessa aurora forte
São como beijos de mãe,
Que nos guardam, nos sustêm,
Contra as injúrias da sorte. Desfralda a invicta Bandeira,
À luz viva do teu céu !
Brade a Europa à Terra inteira:
Portugal não pereceu !
Beija o solo teu jucundo
O Oceano, a rugir d'amor,
E o teu braço vencedor
Deu Mundos novos ao Mundo !
Às armas, às armas !
Sobre a terra sobre o mar.
Às armas, às armas !
Pela Pátria lutar !
Contra os canhões marchar, marchar !
Poesia de H. Lopes de Mendonça
Música de Alfredo Keil
Heróis do mar, nobre povo,
Nação valente, imortal,
Levantai hoje de novo
O esplendor de Portugal !
Entre as brumas da memória,
Ó Pátria, sente-se a voz
Dos teus egrégios avós
Que há-de guiar-te à vitória !
Às armas, às armas !
Sobre a terra sobre o mar.
Às armas, às armas !
Pela Pátria lutar !
Contra os canhões marchar, marchar !
Saudai o sol que desponta
Sobre um ridente porvir;
Seja o eco de uma afronta
O sinal do ressurgir.
Raios dessa aurora forte
São como beijos de mãe,
Que nos guardam, nos sustêm,
Contra as injúrias da sorte. Desfralda a invicta Bandeira,
À luz viva do teu céu !
Brade a Europa à Terra inteira:
Portugal não pereceu !
Beija o solo teu jucundo
O Oceano, a rugir d'amor,
E o teu braço vencedor
Deu Mundos novos ao Mundo !
Às armas, às armas !
Sobre a terra sobre o mar.
Às armas, às armas !
Pela Pátria lutar !
Contra os canhões marchar, marchar !
Poesia de H. Lopes de Mendonça
Música de Alfredo Keil
segunda-feira, julho 21, 2003
SODADE
Quem mostra' bo
Ess caminho longe?
Quem mostra'bo
Ess caminho longe?
Ess caminho
Pa Sao Tomé
Sodade sodade
Sodade
Dess nha terra Sao Nicolau
Si bô 'screvê' me
'M ta 'screvê be
Si bô 'squecê me
'M ta 'squecê be
Até dia
Qui bô voltà
Sodade sodade
Sodade
Dess nha terra Sao Nicolau
Luis Morais - Amandio Cabral
Quem mostra' bo
Ess caminho longe?
Quem mostra'bo
Ess caminho longe?
Ess caminho
Pa Sao Tomé
Sodade sodade
Sodade
Dess nha terra Sao Nicolau
Si bô 'screvê' me
'M ta 'screvê be
Si bô 'squecê me
'M ta 'squecê be
Até dia
Qui bô voltà
Sodade sodade
Sodade
Dess nha terra Sao Nicolau
Luis Morais - Amandio Cabral
domingo, julho 20, 2003
Ao Fernando Alves da TSF que de tanto o ler me encantou
Não sei nada
Conheço as palavras pelo dorso. Outro, no meu lugar, diria que sou um domador de palavras. Mas só eu - eu e os meus irmãos - sei em que medida sou eu que sou domado por elas. A iniciativa pertence-lhes. São elas que conduzem o meu trenó sem chicote, nem rédeas, nem caminho determinado antes da grande aventura.
Sim. Conheço as palavras. Tenho um vocabulário próprio. O que sofri, o que vim a saber com muito esforço fez inchar, rolar umas sobre as outras as palavras. As palavras são seixos que rolo na boca antes de as soltar. São pesadas e caem. São o contrário dos pássaros, embora «pássaro» seja uma das palavras. A minha vida passou para o dicionário que sou. A vida não interessa. Alguém que me procure tem de começar - e de se ficar - pelas palavras. Através das várias relações de vizinhança, entre elas estabelecidas no poema, talvez venha a saber alguma coisa. Até não saber nada, como não sei.
Ruy Belo
A melhor forma de mostrar um país abreviado, sem lhe perder o tutano, não será através da poesia?
Torga sobre Camões
Lápide
Luís Vaz de Camões.
Poeta infortunado e tutelar.
Fez o milagre de ressuscitar
A Pátria em que nasceu.
Quando, vidente, a viu
A caminho da negra sepultura,
Num poema de amor e de aventura
Deu-lhe a vida
Perdida.
E agora,
Nesta segunda hora
De vil tristeza,
Imortal,
É ele ainda a única certeza
De Portugal.
Torga sobre Camões
Lápide
Luís Vaz de Camões.
Poeta infortunado e tutelar.
Fez o milagre de ressuscitar
A Pátria em que nasceu.
Quando, vidente, a viu
A caminho da negra sepultura,
Num poema de amor e de aventura
Deu-lhe a vida
Perdida.
E agora,
Nesta segunda hora
De vil tristeza,
Imortal,
É ele ainda a única certeza
De Portugal.
sábado, julho 19, 2003
The Barry Williams Show
let’s go
one man at the window
one girl at the bar
saw that look of recognition
when they know just who you are
i seen you on the tv
i seen you on that show
where you make the people crazy
and then you let them go
before the show we calm them
we sympathise, we care
and the hostile folk we keep apart
‘til the red light says 'on air’
did you see our leather lovers
all tied up to the chair
did you catch those child molesters
no one else goes there
what a show, the barry williams show
what a show,
dysfunctional excess
is all it took for my success
the greater pain that they endure
the more you know the show has scored
its showtime
got the reputation of a surgeon
cos they cannot feel the cut
it looks so very simple
but it really is an art
they call our studio 'the hospital'
making money from the sick
we let people be themselves
there is no other trick
'my lover stole my girlfriend'
'i keep beating up my ex'
'i want to kill my neighbour'
'my daughter's selling sex'
'my s/m lover hurt me'
'my girl became a man'
'i love my daughter's rapist'
'my life's gone down the pan'
what a show, the barry williams show
the barry williams show
dysfunctional excess
is all it took for my success
and when the punches start to fly
the ratings always read so high
its showtime
‘that girl has got no scruples
not a wrinkle on her face
you would not believe the plot she concieved
so they'd let her take my place
well, no man is an island
no man is a sea
but this display of emotion
is all but drowning me
what a show, oh what a show
on my show, the barry williams show
it’s my show
what a show
dysfunctional excess
is all it took for my success
the best tv you’ve ever seen
where people say the things they really mean
I hear my name, i hear them roar
for the one more time i take the floor
just one more barry williams show
we’re gonna take you where you want to go it’s showtime
come on down
come on down
Peter Gabriel
let’s go
one man at the window
one girl at the bar
saw that look of recognition
when they know just who you are
i seen you on the tv
i seen you on that show
where you make the people crazy
and then you let them go
before the show we calm them
we sympathise, we care
and the hostile folk we keep apart
‘til the red light says 'on air’
did you see our leather lovers
all tied up to the chair
did you catch those child molesters
no one else goes there
what a show, the barry williams show
what a show,
dysfunctional excess
is all it took for my success
the greater pain that they endure
the more you know the show has scored
its showtime
got the reputation of a surgeon
cos they cannot feel the cut
it looks so very simple
but it really is an art
they call our studio 'the hospital'
making money from the sick
we let people be themselves
there is no other trick
'my lover stole my girlfriend'
'i keep beating up my ex'
'i want to kill my neighbour'
'my daughter's selling sex'
'my s/m lover hurt me'
'my girl became a man'
'i love my daughter's rapist'
'my life's gone down the pan'
what a show, the barry williams show
the barry williams show
dysfunctional excess
is all it took for my success
and when the punches start to fly
the ratings always read so high
its showtime
‘that girl has got no scruples
not a wrinkle on her face
you would not believe the plot she concieved
so they'd let her take my place
well, no man is an island
no man is a sea
but this display of emotion
is all but drowning me
what a show, oh what a show
on my show, the barry williams show
it’s my show
what a show
dysfunctional excess
is all it took for my success
the best tv you’ve ever seen
where people say the things they really mean
I hear my name, i hear them roar
for the one more time i take the floor
just one more barry williams show
we’re gonna take you where you want to go it’s showtime
come on down
come on down
Peter Gabriel
sexta-feira, julho 18, 2003
Rádio Macau
Amanhã é Sempre Longe Demais
P'la janela
mal fechada
entra já a luz do dia
Morre a sombra
desejada
duma esperança fugidia
Foi uma
noite sem sono
Entre saliva e suor
Com um travo
de abandono
e gosto a outro sabor
Diz-me até amanhã
que tem de ser que te vais
Só que amanhã sabes bem
é sempre longe demais
P'la janela
mal fechada
chega a hora do cansaço
Vai-se o tempo desfiando
em anéis de fumo baço
Acendo mais um cigarro
Invento mil ideais
Porque amanhã sei-o bem
é sempre longe demais
Amanhã é Sempre Longe Demais
P'la janela
mal fechada
entra já a luz do dia
Morre a sombra
desejada
duma esperança fugidia
Foi uma
noite sem sono
Entre saliva e suor
Com um travo
de abandono
e gosto a outro sabor
Diz-me até amanhã
que tem de ser que te vais
Só que amanhã sabes bem
é sempre longe demais
P'la janela
mal fechada
chega a hora do cansaço
Vai-se o tempo desfiando
em anéis de fumo baço
Acendo mais um cigarro
Invento mil ideais
Porque amanhã sei-o bem
é sempre longe demais
quinta-feira, julho 17, 2003
Ó da Guarda!
Anjinho da guarda
minha boa companhia
Guardai a minha alma
de noite e de dia.
Dedicado ao "depósito obrigatório" da internet portuguesa
Anjinho da guarda
minha boa companhia
Guardai a minha alma
de noite e de dia.
Dedicado ao "depósito obrigatório" da internet portuguesa
quarta-feira, julho 16, 2003
Quem cantou estes versos populares?
Saudosa Maloca
Si o sinhô num tá alembrado
Dá licensa di eu contá
Qui aqui aonde agora istá
Esse adifício arto
Era uma casa véia
Um palacete assobradado
Foi aqui seu moço
Qui eu, Mato Grosso e Joca
Construímo nossa maloca
Mais um dia
Nóis nem pode si alembrá
Veio os home cas ferramenta
O dono mandô derrubá
Peguemos tudo as nossas coisa
E fumos pro meio da rua
Apriciá a demolição
Qui tristeza qui nóis sintia
Cada táuba qui caía
Doía no coração
Mato grosso quis gritá
Mais em cimam eu falei
Os home tá cá razão
Nóis arranja ôtro lugar
Só si conformemos
Condo Joca falô
Deus dá o frio
Conforme o cobertô
E hoje nóis pega paia
Nas grama dos jardim
E pr'á isquecê
Nóis cantemos assim
Saudosa maloca, maloca quirida
Din-din-donde nóis passemos
Dias filiz di nossas vida...
Saudosa Maloca
Si o sinhô num tá alembrado
Dá licensa di eu contá
Qui aqui aonde agora istá
Esse adifício arto
Era uma casa véia
Um palacete assobradado
Foi aqui seu moço
Qui eu, Mato Grosso e Joca
Construímo nossa maloca
Mais um dia
Nóis nem pode si alembrá
Veio os home cas ferramenta
O dono mandô derrubá
Peguemos tudo as nossas coisa
E fumos pro meio da rua
Apriciá a demolição
Qui tristeza qui nóis sintia
Cada táuba qui caía
Doía no coração
Mato grosso quis gritá
Mais em cimam eu falei
Os home tá cá razão
Nóis arranja ôtro lugar
Só si conformemos
Condo Joca falô
Deus dá o frio
Conforme o cobertô
E hoje nóis pega paia
Nas grama dos jardim
E pr'á isquecê
Nóis cantemos assim
Saudosa maloca, maloca quirida
Din-din-donde nóis passemos
Dias filiz di nossas vida...
terça-feira, julho 15, 2003
A Morte saiu à rua
A morte
Saiu à rua
Num dia assim
Naquele
Lugar sem nome
Pra qualquer fim
Uma
Gota rubra
sobre a calçada
Cai
E um rio
De sangue
Dum
Peito aberto
Sai
O vento
Que dá nas canas
Do canavial
E a foice
Duma ceifeira
De Portugal
E o som
Da bigorna
Como
Um clarim do céu
Vão dizendo
em toda a parte
O pintor morreu
Teu sangue,
Pintor, reclama
Outra morte
Igual
Só olho
Por olho e
Dente por dente
Vale
À lei assassina
À morte
Que te matou
Teu corpo
Pertence à terra
Que te abraçou
Aqui
Te afirmamos
Dente por dente
Assim
Que um dia
Rirá melhor
Quem rirá
Por fim
Na curva
Da estrada
Há covas
Feitas no chão
E em todas
Florirão rosas
Duma nação
José Afonso
Para mais José Afonso escrito, ir aqui.
A morte
Saiu à rua
Num dia assim
Naquele
Lugar sem nome
Pra qualquer fim
Uma
Gota rubra
sobre a calçada
Cai
E um rio
De sangue
Dum
Peito aberto
Sai
O vento
Que dá nas canas
Do canavial
E a foice
Duma ceifeira
De Portugal
E o som
Da bigorna
Como
Um clarim do céu
Vão dizendo
em toda a parte
O pintor morreu
Teu sangue,
Pintor, reclama
Outra morte
Igual
Só olho
Por olho e
Dente por dente
Vale
À lei assassina
À morte
Que te matou
Teu corpo
Pertence à terra
Que te abraçou
Aqui
Te afirmamos
Dente por dente
Assim
Que um dia
Rirá melhor
Quem rirá
Por fim
Na curva
Da estrada
Há covas
Feitas no chão
E em todas
Florirão rosas
Duma nação
José Afonso
Para mais José Afonso escrito, ir aqui.
segunda-feira, julho 14, 2003
A última do primeiro...
Foi por aqui que me apaixonei pel'Os Lusiadas...
(...)No mar tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida!
Na terra tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade avorrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?
Luis Vaz de Camões
Foi por aqui que me apaixonei pel'Os Lusiadas...
(...)No mar tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida!
Na terra tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade avorrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?
Luis Vaz de Camões
Se houvesse degraus na terra...
Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,
eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.
No céu podia tecer uma nuvem toda negra.
E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,
e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.
Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,
levei um lenço à boca e o lenço fez-se vermelho.
Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,
e a fímbria do mar, e o meio do mar,
e vermelhas se volveram as asas da águia
que desceu para beber,
e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.
Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo.
Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.
Correram os rapazes à procura da espada,
e as raparigas correram à procura da mantilha,
e correram, correram as crianças à procura da maçã.
Herberto Helder
P.S.: Alguns amigos dizem-no o melhor entre os melhores dos poetas portugueses que ainda sonham sonhos novos.
Mal o conheço...
Há algumas páginas bonitas com poemas de Herberto Helder. Recomendo uma simples pesquisa no Google para começar.
Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,
eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.
No céu podia tecer uma nuvem toda negra.
E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,
e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.
Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,
levei um lenço à boca e o lenço fez-se vermelho.
Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,
e a fímbria do mar, e o meio do mar,
e vermelhas se volveram as asas da águia
que desceu para beber,
e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.
Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo.
Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.
Correram os rapazes à procura da espada,
e as raparigas correram à procura da mantilha,
e correram, correram as crianças à procura da maçã.
Herberto Helder
P.S.: Alguns amigos dizem-no o melhor entre os melhores dos poetas portugueses que ainda sonham sonhos novos.
Mal o conheço...
Há algumas páginas bonitas com poemas de Herberto Helder. Recomendo uma simples pesquisa no Google para começar.
domingo, julho 13, 2003
sábado, julho 12, 2003
Quase
Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num baixo mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tude se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo... e tudo errou...
- Ai a dor de ser-quase, dor sem fim... -
Eu falhei-me entr os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...
Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
..............................................................
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Mário de Sá-Carneiro
Este e mais uns (poucos) poemas podem encontrar-se aqui.
É impressionante a quantidade de páginas em alemão, português do Brasil e outras línguas em que aparece este nosso poeta...
Mais um para terminar...
Eu não sou eu nem sou o outro,
Sou qualquer coisa de intermédio:
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o outro.
Bom fim de semana!
Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num baixo mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tude se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo... e tudo errou...
- Ai a dor de ser-quase, dor sem fim... -
Eu falhei-me entr os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...
Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
..............................................................
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Mário de Sá-Carneiro
Este e mais uns (poucos) poemas podem encontrar-se aqui.
É impressionante a quantidade de páginas em alemão, português do Brasil e outras línguas em que aparece este nosso poeta...
Mais um para terminar...
Eu não sou eu nem sou o outro,
Sou qualquer coisa de intermédio:
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o outro.
Bom fim de semana!
sexta-feira, julho 11, 2003
E para terminar a triologia...
Beijos
Beijos,
Ainda quero mais beijos teus
Beijos,
Para satisfazer os meus
Beijos,
Nem que sejam de falsidade
Beijos,
Melhor que se fossem de verdade
Cartola
Para mais Cartola e outros fui aqui.
Beijos
Beijos,
Ainda quero mais beijos teus
Beijos,
Para satisfazer os meus
Beijos,
Nem que sejam de falsidade
Beijos,
Melhor que se fossem de verdade
Cartola
Para mais Cartola e outros fui aqui.
quinta-feira, julho 10, 2003
Ainda sob o signo do Brasil... (a pedido de várias famílias substitui-se o excerto pela versão integral)
O Navio Negreiro (act)
I
'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço
Brinca o luar — dourada borboleta;
E as vagas após ele correm... cansam
Como turba de infantes inquieta.
'Stamos em pleno mar... Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro...
O mar em troca acende as ardentias,
— Constelações do líquido tesouro...
'Stamos em pleno mar... Dois infinitos
Ali se estreitam num abraço insano,
Azuis, dourados, plácidos, sublimes...
Qual dos dous é o céu? qual o oceano?...
'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas...
Donde vem? onde vai? Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?
Neste saara os corcéis o pó levantam,
Galopam, voam, mas não deixam traço.
Bem feliz quem ali pode nest'hora
Sentir deste painel a majestade!
Embaixo — o mar em cima — o firmamento...
E no mar e no céu — a imensidade!
Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Que música suave ao longe soa!
Meu Deus! como é sublime um canto ardente
Pelas vagas sem fim boiando à toa!
Homens do mar! ó rudes marinheiros,
Tostados pelo sol dos quatro mundos!
Crianças que a procela acalentara
No berço destes pélagos profundos!
Esperai! esperai! deixai que eu beba
Esta selvagem, livre poesia
Orquestra — é o mar, que ruge pela proa,
E o vento, que nas cordas assobia...
..........................................................
Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta?
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira
Que semelha no mar — doudo cometa!
Albatroz! Albatroz! águia do oceano,
Tu que dormes das nuvens entre as gazas,
Sacode as penas, Leviathan do espaço,
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas.
II
Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a morte é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
As vagas que deixa após.
Do Espanhol as cantilenas
Requebradas de langor,
Lembram as moças morenas,
As andaluzas em flor!
Da Itália o filho indolente
Canta Veneza dormente,
— Terra de amor e traição,
Ou do golfo no regaço
Relembra os versos de Tasso,
Junto às lavas do vulcão!
O Inglês — marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou,
(Porque a Inglaterra é um navio,
Que Deus na Mancha ancorou),
Rijo entoa pátrias glórias,
Lembrando, orgulhoso, histórias
De Nelson e de Aboukir.. .
O Francês — predestinado —
Canta os louros do passado
E os loureiros do porvir!
Os marinheiros Helenos,
Que a vaga jônia criou,
Belos piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou,
Homens que Fídias talhara,
Vão cantando em noite clara
Versos que Homero gemeu ...
Nautas de todas as plagas,
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu! ...
III
Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador!
Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras!
É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...
Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!
IV
Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."
E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
V
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!
Quem são estes desgraçados
Que não encontram em vós
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são? Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa...
Dize-o tu, severa Musa,
Musa libérrima, audaz!...
São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão. . .
São mulheres desgraçadas,
Como Agar o foi também.
Que sedentas, alquebradas,
De longe... bem longe vêm...
Trazendo com tíbios passos,
Filhos e algemas nos braços,
N'alma — lágrimas e fel...
Como Agar sofrendo tanto,
Que nem o leite de pranto
Têm que dar para Ismael.
Lá nas areias infindas,
Das palmeiras no país,
Nasceram crianças lindas,
Viveram moças gentis...
Passa um dia a caravana,
Quando a virgem na cabana
Cisma da noite nos véus ...
... Adeus, ó choça do monte,
... Adeus, palmeiras da fonte!...
... Adeus, amores... adeus!...
Depois, o areal extenso...
Depois, o oceano de pó.
Depois no horizonte imenso
Desertos... desertos só...
E a fome, o cansaço, a sede...
Ai! quanto infeliz que cede,
E cai p'ra não mais s'erguer!...
Vaga um lugar na cadeia,
Mas o chacal sobre a areia
Acha um corpo que roer.
Ontem a Serra Leoa,
A guerra, a caça ao leão,
O sono dormido à toa
Sob as tendas d'amplidão!
Hoje... o porão negro, fundo,
Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar...
E o sono sempre cortado
Pelo arranco de um finado,
E o baque de um corpo ao mar...
Ontem plena liberdade,
A vontade por poder...
Hoje... cúm'lo de maldade,
Nem são livres p'ra morrer. .
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.
E assim zombando da morte,
Dança a lúgubre coorte
Ao som do açoute... Irrisão!...
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus,
Se eu deliro... ou se é verdade
Tanto horror perante os céus?!...
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão?
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão! ...
VI
Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...
Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu nas vagas,
Como um íris no pélago profundo!
Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares!
Antonio de Castro Alves
O poema foi retirado daqui, vale apena dar uma espreitadela.
O Navio Negreiro (act)
I
'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço
Brinca o luar — dourada borboleta;
E as vagas após ele correm... cansam
Como turba de infantes inquieta.
'Stamos em pleno mar... Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro...
O mar em troca acende as ardentias,
— Constelações do líquido tesouro...
'Stamos em pleno mar... Dois infinitos
Ali se estreitam num abraço insano,
Azuis, dourados, plácidos, sublimes...
Qual dos dous é o céu? qual o oceano?...
'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas...
Donde vem? onde vai? Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?
Neste saara os corcéis o pó levantam,
Galopam, voam, mas não deixam traço.
Bem feliz quem ali pode nest'hora
Sentir deste painel a majestade!
Embaixo — o mar em cima — o firmamento...
E no mar e no céu — a imensidade!
Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Que música suave ao longe soa!
Meu Deus! como é sublime um canto ardente
Pelas vagas sem fim boiando à toa!
Homens do mar! ó rudes marinheiros,
Tostados pelo sol dos quatro mundos!
Crianças que a procela acalentara
No berço destes pélagos profundos!
Esperai! esperai! deixai que eu beba
Esta selvagem, livre poesia
Orquestra — é o mar, que ruge pela proa,
E o vento, que nas cordas assobia...
..........................................................
Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta?
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira
Que semelha no mar — doudo cometa!
Albatroz! Albatroz! águia do oceano,
Tu que dormes das nuvens entre as gazas,
Sacode as penas, Leviathan do espaço,
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas.
II
Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a morte é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
As vagas que deixa após.
Do Espanhol as cantilenas
Requebradas de langor,
Lembram as moças morenas,
As andaluzas em flor!
Da Itália o filho indolente
Canta Veneza dormente,
— Terra de amor e traição,
Ou do golfo no regaço
Relembra os versos de Tasso,
Junto às lavas do vulcão!
O Inglês — marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou,
(Porque a Inglaterra é um navio,
Que Deus na Mancha ancorou),
Rijo entoa pátrias glórias,
Lembrando, orgulhoso, histórias
De Nelson e de Aboukir.. .
O Francês — predestinado —
Canta os louros do passado
E os loureiros do porvir!
Os marinheiros Helenos,
Que a vaga jônia criou,
Belos piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou,
Homens que Fídias talhara,
Vão cantando em noite clara
Versos que Homero gemeu ...
Nautas de todas as plagas,
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu! ...
III
Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador!
Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras!
É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...
Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!
IV
Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."
E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
V
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!
Quem são estes desgraçados
Que não encontram em vós
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são? Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa...
Dize-o tu, severa Musa,
Musa libérrima, audaz!...
São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão. . .
São mulheres desgraçadas,
Como Agar o foi também.
Que sedentas, alquebradas,
De longe... bem longe vêm...
Trazendo com tíbios passos,
Filhos e algemas nos braços,
N'alma — lágrimas e fel...
Como Agar sofrendo tanto,
Que nem o leite de pranto
Têm que dar para Ismael.
Lá nas areias infindas,
Das palmeiras no país,
Nasceram crianças lindas,
Viveram moças gentis...
Passa um dia a caravana,
Quando a virgem na cabana
Cisma da noite nos véus ...
... Adeus, ó choça do monte,
... Adeus, palmeiras da fonte!...
... Adeus, amores... adeus!...
Depois, o areal extenso...
Depois, o oceano de pó.
Depois no horizonte imenso
Desertos... desertos só...
E a fome, o cansaço, a sede...
Ai! quanto infeliz que cede,
E cai p'ra não mais s'erguer!...
Vaga um lugar na cadeia,
Mas o chacal sobre a areia
Acha um corpo que roer.
Ontem a Serra Leoa,
A guerra, a caça ao leão,
O sono dormido à toa
Sob as tendas d'amplidão!
Hoje... o porão negro, fundo,
Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar...
E o sono sempre cortado
Pelo arranco de um finado,
E o baque de um corpo ao mar...
Ontem plena liberdade,
A vontade por poder...
Hoje... cúm'lo de maldade,
Nem são livres p'ra morrer. .
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.
E assim zombando da morte,
Dança a lúgubre coorte
Ao som do açoute... Irrisão!...
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus,
Se eu deliro... ou se é verdade
Tanto horror perante os céus?!...
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão?
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão! ...
VI
Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...
Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu nas vagas,
Como um íris no pélago profundo!
Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares!
Antonio de Castro Alves
O poema foi retirado daqui, vale apena dar uma espreitadela.
Mãos Dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.
Carlos Drummond de Andrade
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.
Carlos Drummond de Andrade
quarta-feira, julho 09, 2003
O Primeiro Gomo da Tangerina
Todos vieram
ver a menina
ao primeiro gomo de tangerina
menina atenta
não experimenta
sem primeiro
saber do cheiro
o sabor dos lábios
gestos sábios
Fruta esquisita
menina aflita
ao primeiro gomo de tangerina
amarga e doce
como se fosse
essa hora
em que chora
e depois dobra o riso
e assim faz seu juízo
Sumo na vida
é o que eu te desejo
um beijo um beijo
Ah, que se lembre
sempre a menina
do primeiro gomo de tangerina
p'la vida dentro
é esse o centro
da parcela da vitamina
que a faz crescer sempre menina
A terra é grande
é pequenina
do tamanho apenas da tangerina
quem mata e morra
nunca percorre
os caminhos do que há de melhor
nesse sumo
a vida, gomo a gomo
Sumo na vida
é o que eu te desejo
rumo na vida
um beijo
um beijo
Letra: Sérgio Godinho
Afinal o Instituto Camões anda a fazer alguma coisa...
Todos vieram
ver a menina
ao primeiro gomo de tangerina
menina atenta
não experimenta
sem primeiro
saber do cheiro
o sabor dos lábios
gestos sábios
Fruta esquisita
menina aflita
ao primeiro gomo de tangerina
amarga e doce
como se fosse
essa hora
em que chora
e depois dobra o riso
e assim faz seu juízo
Sumo na vida
é o que eu te desejo
um beijo um beijo
Ah, que se lembre
sempre a menina
do primeiro gomo de tangerina
p'la vida dentro
é esse o centro
da parcela da vitamina
que a faz crescer sempre menina
A terra é grande
é pequenina
do tamanho apenas da tangerina
quem mata e morra
nunca percorre
os caminhos do que há de melhor
nesse sumo
a vida, gomo a gomo
Sumo na vida
é o que eu te desejo
rumo na vida
um beijo
um beijo
Letra: Sérgio Godinho
Afinal o Instituto Camões anda a fazer alguma coisa...
segunda-feira, julho 07, 2003
Selecção poesia
Então e que tal uma sugestão de poesia de um leigo?
Vou me basear no popular, no musicado, e tomar de empréstimo dos autores que divulguem a sua poesia livremente na Net.
É um pequeno lugar para reler o que muitas vezes mal se ouve dando uma hipótese a essa poesia de nos chegar por si.
Leiam este e digam lá se o mundo não parece muito pequeno.
AS COISAS
letra de Arnaldo Antunes
música de Gilberto Gil
1993
As coisas têm
Peso, massa, volume
Tamanho, tempo
Forma, cor
Posição
Textura, duração
Densidade
Cheiro
Valor
Consistência
Profundidade, contorno
Temperatura, função
Aparência
Preço, destino, idade
Sentido
As coisas não têm paz
As coisas
© Cíclope (Warner-Chappell Edições Musicais Ltda.) / Gegê Produções Artísticas Ltda.
Retirado daqui.
Então e que tal uma sugestão de poesia de um leigo?
Vou me basear no popular, no musicado, e tomar de empréstimo dos autores que divulguem a sua poesia livremente na Net.
É um pequeno lugar para reler o que muitas vezes mal se ouve dando uma hipótese a essa poesia de nos chegar por si.
Leiam este e digam lá se o mundo não parece muito pequeno.
AS COISAS
letra de Arnaldo Antunes
música de Gilberto Gil
1993
As coisas têm
Peso, massa, volume
Tamanho, tempo
Forma, cor
Posição
Textura, duração
Densidade
Cheiro
Valor
Consistência
Profundidade, contorno
Temperatura, função
Aparência
Preço, destino, idade
Sentido
As coisas não têm paz
As coisas
© Cíclope (Warner-Chappell Edições Musicais Ltda.) / Gegê Produções Artísticas Ltda.
Retirado daqui.
Última hora!
É tão previsível este nosso Bush...
Leiam bem mais esta aqui em baixo, que se apresenta na formulação da TSF, e digam lá se nós não vamos a caminho de um estatuto Porto Riquenho?
Viva Portugal! Ó Lula deixa-me lá ser Brasileiro....
TPI
EUA «castigam» quem não os torna «imunes»
Os EUA retiraram ajuda militar a 35 países que não assinaram em tempo útil acordos que previam a protecção de cidadãos norte-americanos eventualmente perseguidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), anunciou o Departamento de Estado. O porta-voz do Departamento de Estado, Richard Boucher, lembrou que o Congresso norte-americano tinha fixado o dia 1 de Julho como prazo-limite para a assinatura desses acordos.
A Casa Branca anunciou também hoje que 16 países não verão as ajudas suspensas ou porque já assinaram os acordos, faltando apenas ratificá-los localmente, ou porque são considerados aliados suficientemente importantes. De acordo com a lista divulgada pelo Departamento de Estado, são os seguintes os países «castigados»:
África:
Benin, Republica centroafricana, Lesoto, Malawi, Máli, Namíbia, Niger, África do Sul, Tanzânia, Zâmbia.
Europa:
Bulgária, Croácia, Estónia, Lituânia, Letónia, Malta, Servia-Montenegro, Eslováquia e Eslovénia.
Continente americano:
Antígua, Barbados, Belize, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Dominica, Equador, Paraguai, Peru, São Vicente e Grenadine, Trindade e Tobago, Uruguai, Venezuela
Ásia-Pacífico:
Fidji e Samoa.
O montante das ajudas em causa orçava 46,7 milhões de dólares para o ano fiscal em curso, disse a mesma fonte.
Os EUA sempre se opuseram ao TPI, que tem como missão julgar crimes de guerra e contra a humanidade, considerando que existe o risco de uma Justiça politizada que pode pôr em causa a posição de militares norte-americanos em missões no estrangeiro.
A União Europeia, recorde-se, aprovou um acordo em Setembro passado, concedendo imunidade aos diplomatas norte-americanos perseguidos pelo TPI que se encontrem em território da União.
É tão previsível este nosso Bush...
Leiam bem mais esta aqui em baixo, que se apresenta na formulação da TSF, e digam lá se nós não vamos a caminho de um estatuto Porto Riquenho?
Viva Portugal! Ó Lula deixa-me lá ser Brasileiro....
TPI
EUA «castigam» quem não os torna «imunes»
Os EUA retiraram ajuda militar a 35 países que não assinaram em tempo útil acordos que previam a protecção de cidadãos norte-americanos eventualmente perseguidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), anunciou o Departamento de Estado. O porta-voz do Departamento de Estado, Richard Boucher, lembrou que o Congresso norte-americano tinha fixado o dia 1 de Julho como prazo-limite para a assinatura desses acordos.
A Casa Branca anunciou também hoje que 16 países não verão as ajudas suspensas ou porque já assinaram os acordos, faltando apenas ratificá-los localmente, ou porque são considerados aliados suficientemente importantes. De acordo com a lista divulgada pelo Departamento de Estado, são os seguintes os países «castigados»:
África:
Benin, Republica centroafricana, Lesoto, Malawi, Máli, Namíbia, Niger, África do Sul, Tanzânia, Zâmbia.
Europa:
Bulgária, Croácia, Estónia, Lituânia, Letónia, Malta, Servia-Montenegro, Eslováquia e Eslovénia.
Continente americano:
Antígua, Barbados, Belize, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Dominica, Equador, Paraguai, Peru, São Vicente e Grenadine, Trindade e Tobago, Uruguai, Venezuela
Ásia-Pacífico:
Fidji e Samoa.
O montante das ajudas em causa orçava 46,7 milhões de dólares para o ano fiscal em curso, disse a mesma fonte.
Os EUA sempre se opuseram ao TPI, que tem como missão julgar crimes de guerra e contra a humanidade, considerando que existe o risco de uma Justiça politizada que pode pôr em causa a posição de militares norte-americanos em missões no estrangeiro.
A União Europeia, recorde-se, aprovou um acordo em Setembro passado, concedendo imunidade aos diplomatas norte-americanos perseguidos pelo TPI que se encontrem em território da União.
O espanto de me espantar...
Espiem só esta notícia da TSF - logo a seguir à indignação dos cidadãos que querem elevar a Tocha a concelho:
"ALEMANHA
Conduzir a fazer sexo não é crime
Um cidadão alemão que estava a fazer sexo enquanto conduzia num auto-estrada foi condenado, não por estar a fazer sexo, mas por ter fugido depois de bater num sinal.
15:54
01 de Julho 03
A situação caricata deve-se a um «vazio legal». Segundo o porta-voz de um tribunal de Colónia, o legislador não admitiu essa possibilidade: conduzir e fazer sexo ao mesmo tempo.
Era o que estava a fazer um cidadão alemão e viajava a cem quilómetros hora.
Foi condenado a pagar uma multa de seiscentos euros porque bateu num sinal e fugiu. Teve ainda de pagar mais quatrocentos euros pela reparação da sinalização."
Se a moda pega lá vamos ouvir atentamente o Sub-chefe Silva da Brigada de Trânsito com algo do género:
"Pedimos aos senhores automobilistas que conservem as distâncias de segurança, adaptando a velocidade de condução ao estado do piso e às condições meteorologicas e acima de tudo usem sempre o preservativo e o cinto de segurança".
Espiem só esta notícia da TSF - logo a seguir à indignação dos cidadãos que querem elevar a Tocha a concelho:
"ALEMANHA
Conduzir a fazer sexo não é crime
Um cidadão alemão que estava a fazer sexo enquanto conduzia num auto-estrada foi condenado, não por estar a fazer sexo, mas por ter fugido depois de bater num sinal.
15:54
01 de Julho 03
A situação caricata deve-se a um «vazio legal». Segundo o porta-voz de um tribunal de Colónia, o legislador não admitiu essa possibilidade: conduzir e fazer sexo ao mesmo tempo.
Era o que estava a fazer um cidadão alemão e viajava a cem quilómetros hora.
Foi condenado a pagar uma multa de seiscentos euros porque bateu num sinal e fugiu. Teve ainda de pagar mais quatrocentos euros pela reparação da sinalização."
Se a moda pega lá vamos ouvir atentamente o Sub-chefe Silva da Brigada de Trânsito com algo do género:
"Pedimos aos senhores automobilistas que conservem as distâncias de segurança, adaptando a velocidade de condução ao estado do piso e às condições meteorologicas e acima de tudo usem sempre o preservativo e o cinto de segurança".
ANTES DA DENTADA
Olá! À terceira é de vez. Depois da citação de ontem que se lê ali em baixo e da algo bizarra "carta" de apresentação do primeiro dia - ó pró post de quarta- feira - surge mais um cromo na blogo-esfera a falar na primeira pessoa. Espreitados menos de 10% dos blogues em português (de Portugal) o balanço é bom e não enjoa. É certo que andam muitos em questões existênciais mas vê-se pensamento, sente-se paixão. Há vida nesta galáxia!
Caros blogueres muito gosto!
Pela parte que me toca vou espreitar mais um pouco " ver os blogues passar" como se escrevia há dias no Metrobloguitano.
No passado Sábado, a condutora do metrobloguitano falava-nos de "(...) uma miúda que acorda a meio da noite a chorar. Desperta de um pesadelo. Era um pesadelo estranho, como uma espécie de forma oval e vazia que lhe crescia dentro da boca até quase a sufocar.(...)".
A blogo-esfera exorciza?
Deixa-me cá esperimentar...
A DENTADA
O vulto, com clara silhueta humana, entrava no quarto com muitas cautelas, lentamente. “Talvez não me veja. Vou ficar quietinho” pensava nas primeiras vezes, no entanto, invariavelmente, acabava por fazer qualquer roído e, então, a figura ganhava contornos, iluminada por uma misteriosa luz baça, suficiente para mostrar uma carantonha humana de intenções perfeitamente estampadas. Não era um ladrão, era alguém que sabia bem ao que vinha: vinha à procura do menino para lhe fazer mal.
Após breves momentos em que se ocupava de tentar perceber quais os motivos da anunciada malvadez, a pequena cabecinha do menino começava a debitar, a uma velocidade impressionante, planos de fuga ou de combate. Pensava atordoá-lo atirando-lhe com o candeeiro da mesinha de cabeceira, mas sempre que se lembrava deste expediente era já impossível ter sucesso com a figura tão perto. Decidia então que saltaria da cama esquivando pelo lado oposto, passando por debaixo e fugindo depois do quarto, mas... nunca conseguia mais do que virar o pescoço para o lado. Estava completamente paralisado e na garganta restava-lhe apenas uma língua enorme que quase o sufocava.
Apercebida a vulnerabilidade total, era altura do sorriso convencido do tratante que aproveitava para fazer a última aproximação. No momento seguinte, tinha já as suas mãos no pescoço do menino, tal qual como da última vez. A cada nova tentativa, o menino convencia-se que estava a chegar mais perto dos seus limites. Da última vez quando tinha a certeza que já não conseguiria resistir até ao momento estabelecido do climax onírico em que o monstrengo desapareceria, o menino teve muita sorte. Devido a um incêndio nocturno que houve na praceta, foi acordado pela mãe, precisamente no último fôlego. Mas como será hoje?
As mãos apertam, apertam e esperam pelo último estertor, que teima em demorar. Finalmente, a vítima tem uma fortíssima convulsão, dá um peido e queda-se. Vence o mal? Não vence! O menino fingira para poder recuperar o fôlego, imitando uma cena que vira no filme do dia anterior, oferecida providencialmente pela televisão. Mas o malvado apercebe-se, pouco depois, do palpitar incontido da vítima e o seu rosto transfigura-se totalmente; neste momento, o sonho deixa de ser a simples repetição de todos os outros. O rosto da besta é agora raiva, uma raiva que leva as mãos de novo à garganta do menino. E leva, de facto leva, leva com uma valente dentada em um dos dedos! Tamanha a valentia que a dentada é decepadora. A cena é de espanto entre os dois, um absurdo que só os sonhos nos permitem: o menino revela um interesse quase científico pela morfologia do cepo - a secção do dedo mostrava vários anéis em diversas tonalidades de cinzento, com um central muito claro, quase luminoso- o monstrengo passa da estupefacção a um gesto de pânico e depressa desaparece quando é finalmente acossado pelo menino que salta da cama ao pontapé. Termina o sonho e o menino acorda.
Não dormiu mais a pensar em todo este sonho, na história de todos estes sonhos. Vencera o papão ainda que não lhe soubesse sequer esse nome universal, ainda que não se soubesse apenas um entre muitos outros meninos. Talvez este tivesse sido um dos momentos mais importantes da sua vida, um momento que recordará inúmeras vezes nas mais variadas ocasiões, quase sempre com espanto.
Até breve.
Olá! À terceira é de vez. Depois da citação de ontem que se lê ali em baixo e da algo bizarra "carta" de apresentação do primeiro dia - ó pró post de quarta- feira - surge mais um cromo na blogo-esfera a falar na primeira pessoa. Espreitados menos de 10% dos blogues em português (de Portugal) o balanço é bom e não enjoa. É certo que andam muitos em questões existênciais mas vê-se pensamento, sente-se paixão. Há vida nesta galáxia!
Caros blogueres muito gosto!
Pela parte que me toca vou espreitar mais um pouco " ver os blogues passar" como se escrevia há dias no Metrobloguitano.
No passado Sábado, a condutora do metrobloguitano falava-nos de "(...) uma miúda que acorda a meio da noite a chorar. Desperta de um pesadelo. Era um pesadelo estranho, como uma espécie de forma oval e vazia que lhe crescia dentro da boca até quase a sufocar.(...)".
A blogo-esfera exorciza?
Deixa-me cá esperimentar...
A DENTADA
O vulto, com clara silhueta humana, entrava no quarto com muitas cautelas, lentamente. “Talvez não me veja. Vou ficar quietinho” pensava nas primeiras vezes, no entanto, invariavelmente, acabava por fazer qualquer roído e, então, a figura ganhava contornos, iluminada por uma misteriosa luz baça, suficiente para mostrar uma carantonha humana de intenções perfeitamente estampadas. Não era um ladrão, era alguém que sabia bem ao que vinha: vinha à procura do menino para lhe fazer mal.
Após breves momentos em que se ocupava de tentar perceber quais os motivos da anunciada malvadez, a pequena cabecinha do menino começava a debitar, a uma velocidade impressionante, planos de fuga ou de combate. Pensava atordoá-lo atirando-lhe com o candeeiro da mesinha de cabeceira, mas sempre que se lembrava deste expediente era já impossível ter sucesso com a figura tão perto. Decidia então que saltaria da cama esquivando pelo lado oposto, passando por debaixo e fugindo depois do quarto, mas... nunca conseguia mais do que virar o pescoço para o lado. Estava completamente paralisado e na garganta restava-lhe apenas uma língua enorme que quase o sufocava.
Apercebida a vulnerabilidade total, era altura do sorriso convencido do tratante que aproveitava para fazer a última aproximação. No momento seguinte, tinha já as suas mãos no pescoço do menino, tal qual como da última vez. A cada nova tentativa, o menino convencia-se que estava a chegar mais perto dos seus limites. Da última vez quando tinha a certeza que já não conseguiria resistir até ao momento estabelecido do climax onírico em que o monstrengo desapareceria, o menino teve muita sorte. Devido a um incêndio nocturno que houve na praceta, foi acordado pela mãe, precisamente no último fôlego. Mas como será hoje?
As mãos apertam, apertam e esperam pelo último estertor, que teima em demorar. Finalmente, a vítima tem uma fortíssima convulsão, dá um peido e queda-se. Vence o mal? Não vence! O menino fingira para poder recuperar o fôlego, imitando uma cena que vira no filme do dia anterior, oferecida providencialmente pela televisão. Mas o malvado apercebe-se, pouco depois, do palpitar incontido da vítima e o seu rosto transfigura-se totalmente; neste momento, o sonho deixa de ser a simples repetição de todos os outros. O rosto da besta é agora raiva, uma raiva que leva as mãos de novo à garganta do menino. E leva, de facto leva, leva com uma valente dentada em um dos dedos! Tamanha a valentia que a dentada é decepadora. A cena é de espanto entre os dois, um absurdo que só os sonhos nos permitem: o menino revela um interesse quase científico pela morfologia do cepo - a secção do dedo mostrava vários anéis em diversas tonalidades de cinzento, com um central muito claro, quase luminoso- o monstrengo passa da estupefacção a um gesto de pânico e depressa desaparece quando é finalmente acossado pelo menino que salta da cama ao pontapé. Termina o sonho e o menino acorda.
Não dormiu mais a pensar em todo este sonho, na história de todos estes sonhos. Vencera o papão ainda que não lhe soubesse sequer esse nome universal, ainda que não se soubesse apenas um entre muitos outros meninos. Talvez este tivesse sido um dos momentos mais importantes da sua vida, um momento que recordará inúmeras vezes nas mais variadas ocasiões, quase sempre com espanto.
Até breve.
"(...) Entrar na blogosfera, onde não existem hierarquias e todos os «bloggers» estão em pé de igualdade, exige coragem e humildade. Coragem porque não é fácil sobreviver num meio em que as polémicas são permanentes e agressivas, a troca de argumentos exige boa preparação teórica e o nível médio da escrita é francamente elevado (já para não para falar do escrutínio apertadíssimo feito pelos leitores, nas áreas de comentário). Humildade porque nos apercebemos todos os dias que há pessoas, nomeadamente as que não têm acesso aos jornais, que sabem mais do que nós, são mais cultas do que nós, estão mais bem informadas do que nós e escrevem melhor do que nós. De resto, essa foi uma das principais lições que aprendi nestes seis meses de blogosfera, juntamente com a constatação de uma inesperada generosidade «inter pares». (...) José Mário Silva
[rasp-rasp] Imagine aqui o limpa-pés à porta desta sua casa: "Seja benvindo quem vier por bem!"
A casa por enquanto não tem tecto, apenas umas mantas espalhadas pelo chão em roda de um pequena fogueira. Há uma chaleira para chá e uma cafeteira para café, faltam chicaras, o dito chá, café... há apenas um resto de açucar, nada de adoçantes.
[Olá!] Eis agora o tipo que foi limpar um bocado de mato para acender o lume: Vive em Lisboa e arranjou este bocado de terreno baldio. Trouxe apenas um antigo tapete da capital que vai melhor com a decoração algo rústica deste alojamento. O tapete tem qualquer coisa de familiar que lhe dá conforto num lar provisorio..dá jeito em tão extraordinario ambiente.
Está sentado numa das mantas a ler uma carta...
A casa por enquanto não tem tecto, apenas umas mantas espalhadas pelo chão em roda de um pequena fogueira. Há uma chaleira para chá e uma cafeteira para café, faltam chicaras, o dito chá, café... há apenas um resto de açucar, nada de adoçantes.
[Olá!] Eis agora o tipo que foi limpar um bocado de mato para acender o lume: Vive em Lisboa e arranjou este bocado de terreno baldio. Trouxe apenas um antigo tapete da capital que vai melhor com a decoração algo rústica deste alojamento. O tapete tem qualquer coisa de familiar que lhe dá conforto num lar provisorio..dá jeito em tão extraordinario ambiente.
Está sentado numa das mantas a ler uma carta...
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